sábado, 30 de novembro de 2024

A geopolítica da Europa e o mito do "ocidente europeu"

  Geograficamente, a Europa é uma península da Ásia, isto é, caracteriza-se como um apêndice do grande continente Euroasiático. Isto traz consequências para a sua geopolítica futura e é algo que pesou, durante toda a história da região, no desenvolvimento de certas tendências culturais e eventos históricos, mesmo os mais remotos. Vejam que isto não se trata de um simples fato geográfico: a Europa possui poucas invenções culturais - entre as dignas de nota - verdadeiramente autóctones, e as que possui são em sua maior parte invenções greco-latinas, isto é, são invenções justamente daqueles povos que se situavam na zona limítrofe da Europa e que maior contato tinham com as populações afro-asiáticas do oriente próximo. Delas herdaram a geometria, a matemática, a astronomia, a agrimensura, práticas religiosas etc... Mesmo depois de um período de prolongado contato entre ocidente e oriente, propiciado primeiro pelos reinos helenísticos, depois pelo Império Romano, a influência oriental mostrou-se determinante sobre a Europa: deu origem a todo um novo mundo forjado no fogo (às vezes literal) de uma religião e de uma religiosidade asiáticas, criou uma nova cultura que, ao passo que se situava geograficamente em solo europeu, expressava uma sensibilidade e uma maneira de ver o mundo em que o elemento asiático era determinante. De outro modo, no oriente próximo, as influências europeias foram rapidamente assimiladas em um todo cultural de caráter inequivocamente oriental, isto quando não foram simplesmente suprimidas ou esquecidas. Também a história revela que a Europa é um continente que não se basta a si mesmo: por repetidas vezes tiveram os europeus de deixar os confins de sua península e empreender conquistas de territórios asiáticos, tal como durante as cruzadas, com o expansionismo russo em relação à Sibéria e à Ásia central, por meio do colonialismo europeu etc. O que tudo isso demonstra é que a Europa necessita da Ásia muito mais do que a Ásia necessita da Europa, e no futuro nós poderemos sentir essa necessidade e essa dependência mútuas na cada vez mais imprescindível relação comercial, cultural e tecnológica com a China. Se continuarem as atuais tendências de enfraquecimento do imperialismo europeu na África (vide os recentes acontecimentos envolvendo a França e suas ex-colônias africanas) e de perda de uma já há muito tempo decadente projeção geopolítica, o que veremos é a transformação gradual, mas certa, da zona europeia em uma espécie de apêndice russo-chinês. Resta-nos saber como que as ações do recém-eleito e futuro presidente dos Estados Unidos influirão sobre o desenvolvimento deste quadro. (Ivan Preuss)

Nenhum comentário:

Postar um comentário