Há quem diga que a filosofia se tornou obsoleta. Geralmente, quem diz isto diz também que ela foi superada pela ciência, mas seria isto mesmo assim? Antes de responder propriamente a esta questão, façamos algumas considerações preliminares sobre a ciência moderna. Em primeiro lugar, a ciência se caracteriza como uma espécie de empirismo do senso comum, isto é, ela aceita sem questionar os pressupostos implícitos da sensibilidade. Se um raio atinge um avião, podemos estudar dos pontos de vista da física e da química como este fenômeno é possível, mas para isto deve aceitar-se que existe mesmo um avião, que existe mesmo um raio, que existe mesmo um meio - o ar - através do qual o raio alcançou o avião, que estas três coisas, a saber, o raio, o avião e o meio são realmente distintas, caracterizadas de uma determinada forma e, finalmente, que o raio realmente atingiu o avião. Como podemos ver, são muitos os pressupostos implícitos que servem de base para as operações das ciências, e os quais elas não se propõem a questionar.
Ora, isto tem lá a sua razão. A ciência dos nossos dias não existe no vácuo, mas surge e se justifica para responder a determinadas necessidades da sociedade burguesa. Assim, prende-se a uma certa tecnicalidade ou materialidade implícitas. Este é o nosso segundo ponto. Por se ater sempre à materialidade dos fenômenos, a ciência não é capaz de conceber a realidade numenal, assim como é incapaz de demonstrar que todo e qualquer sentido da existência se esgota no fenomênico. Se, como Anaximandro, considerarmos que tudo quanto existe hoje tem a sua origem num ponto determinado no tempo - no nosso caso, os instantes imediatamente posteriores ao Big Bang -, e se quisermos explicar esta mutabilidade do cosmos através de uma substância ou qualidade única, elementar, mediante a qual a transformação é possível - mas cuja existência é concebida de modo puramente numenal, sendo imperceptível aos sentidos e apreensível somente pelo intelecto -, tal conjetura terá um valor científico desprezível e encontrará respaldo somente na tradição filosófica. E, não obstante, a razão nos compele a aceitar que tal substância é não só lógica, mas necessária, uma vez que, se tudo que existe hoje passou a existir não só depois do Big Bang, mas por causa dele, então deve haver alguma propriedade que torne possível o surgimento das coisas não só depois do Big Bang, mas por meio dele. Esta propriedade pode ser discutida no âmbito da ciência, por exemplo, quando se estudam as transformações da matéria responsáveis pela existência do universo atual, originado de seus estágios arcaicos e anteriores, mas o fato é que, quando falamos das transformações dos elementos da realidade, de coisas se tornando outras coisas, existe aí uma dimensão metafísica intransponível que a ciência fica impossibilitada de examinar.
Sejamos um pouco mais específicos. Quando dizemos que dos instantes imediatamente posteriores ao Big Bang surgiu tudo quanto hoje existe, queremos dizer pelo menos duas coisas. Primeiro, que o universo tal como existiu nos primórdios foi - ou continha em si - aquilo que é responsável por colocar e manter em movimento todo o processo de desenvolvimentos causais que eventualmente resultaria no cosmos tal como existe hoje - ou, na linguagem de Aristóteles, que esse universo dos primórdios é (ou contém em si) a causa eficiente do cosmos dos nossos dias -, e, segundo, que tudo que existe hoje é composto da mesma matéria e da mesma substância das quais era composto o universo arcaico e anterior, apenas modificada e reconstituída sob novas formas - ou, na terminologia aristotélica, que essa substância em comum é a derradeira causa material de todo o cosmos. Vejam, porém, que mesmo aqui ainda há pressupostos implícitos. Se, por exemplo, eu cortar um pedaço de madeira e fizer dele uma tábua, o que me garante que o material desta tábua é o mesmo que o da madeira que a ela deu origem? Por que não haveria um deus ou um demônio ou um gênio que, toda vez que eu cortasse a madeira e a transformasse em tábua, vá lá e substitua o material desta tábua por algo inteiramente novo e distinto, sem que eu nem sequer me dê conta disso? A diferença fundamental, percebam, é que a filosofia pode, sim, reavaliar todos os seus pressupostos, a ciência, não.
O ponto em questão aqui se resume no fato de que a ciência não pode levar em consideração o problema das suas pressuposições porque, se o fizesse, já não seria mais ciência, perderia a qualidade instrumental que a torna tão eficiente na previsão e na descrição do comportamento dos fenômenos. Só o filosofo é capaz de reconsiderar os pressupostos da própria filosofia e, ainda assim, continuar sendo, no campo efetivo da práxis, um sujeito que filosofa, ou seja, alguém que exerce na prática as atribuições características do filósofo. A ciência tomou da filosofia o método cético da Idade Moderna e deu-lhe uma aplicação convenientemente limitada, adequando-o às necessidades prático-empíricas da burguesia ascendente. Mas, assim como os pensadores de outrora invocavam o princípio da superioridade ontológica do imaterial sobre o material, sobretudo para justificar a existência de uma "alma do mundo", também nós poderemos dizer que a aplicação limitada (isto é, no campo material) de um princípio mais geral (quer dizer, fundamentalmente metafísico) nunca resultará num estado de coisas ontoepistemologicamente superior àquele que sucederia se este mesmo princípio fosse, naturalmente, entendido na generalidade que lhe é não só devida, mas originalmente própria.
Ora, isto tem lá a sua razão. A ciência dos nossos dias não existe no vácuo, mas surge e se justifica para responder a determinadas necessidades da sociedade burguesa. Assim, prende-se a uma certa tecnicalidade ou materialidade implícitas. Este é o nosso segundo ponto. Por se ater sempre à materialidade dos fenômenos, a ciência não é capaz de conceber a realidade numenal, assim como é incapaz de demonstrar que todo e qualquer sentido da existência se esgota no fenomênico. Se, como Anaximandro, considerarmos que tudo quanto existe hoje tem a sua origem num ponto determinado no tempo - no nosso caso, os instantes imediatamente posteriores ao Big Bang -, e se quisermos explicar esta mutabilidade do cosmos através de uma substância ou qualidade única, elementar, mediante a qual a transformação é possível - mas cuja existência é concebida de modo puramente numenal, sendo imperceptível aos sentidos e apreensível somente pelo intelecto -, tal conjetura terá um valor científico desprezível e encontrará respaldo somente na tradição filosófica. E, não obstante, a razão nos compele a aceitar que tal substância é não só lógica, mas necessária, uma vez que, se tudo que existe hoje passou a existir não só depois do Big Bang, mas por causa dele, então deve haver alguma propriedade que torne possível o surgimento das coisas não só depois do Big Bang, mas por meio dele. Esta propriedade pode ser discutida no âmbito da ciência, por exemplo, quando se estudam as transformações da matéria responsáveis pela existência do universo atual, originado de seus estágios arcaicos e anteriores, mas o fato é que, quando falamos das transformações dos elementos da realidade, de coisas se tornando outras coisas, existe aí uma dimensão metafísica intransponível que a ciência fica impossibilitada de examinar.
Sejamos um pouco mais específicos. Quando dizemos que dos instantes imediatamente posteriores ao Big Bang surgiu tudo quanto hoje existe, queremos dizer pelo menos duas coisas. Primeiro, que o universo tal como existiu nos primórdios foi - ou continha em si - aquilo que é responsável por colocar e manter em movimento todo o processo de desenvolvimentos causais que eventualmente resultaria no cosmos tal como existe hoje - ou, na linguagem de Aristóteles, que esse universo dos primórdios é (ou contém em si) a causa eficiente do cosmos dos nossos dias -, e, segundo, que tudo que existe hoje é composto da mesma matéria e da mesma substância das quais era composto o universo arcaico e anterior, apenas modificada e reconstituída sob novas formas - ou, na terminologia aristotélica, que essa substância em comum é a derradeira causa material de todo o cosmos. Vejam, porém, que mesmo aqui ainda há pressupostos implícitos. Se, por exemplo, eu cortar um pedaço de madeira e fizer dele uma tábua, o que me garante que o material desta tábua é o mesmo que o da madeira que a ela deu origem? Por que não haveria um deus ou um demônio ou um gênio que, toda vez que eu cortasse a madeira e a transformasse em tábua, vá lá e substitua o material desta tábua por algo inteiramente novo e distinto, sem que eu nem sequer me dê conta disso? A diferença fundamental, percebam, é que a filosofia pode, sim, reavaliar todos os seus pressupostos, a ciência, não.
O ponto em questão aqui se resume no fato de que a ciência não pode levar em consideração o problema das suas pressuposições porque, se o fizesse, já não seria mais ciência, perderia a qualidade instrumental que a torna tão eficiente na previsão e na descrição do comportamento dos fenômenos. Só o filosofo é capaz de reconsiderar os pressupostos da própria filosofia e, ainda assim, continuar sendo, no campo efetivo da práxis, um sujeito que filosofa, ou seja, alguém que exerce na prática as atribuições características do filósofo. A ciência tomou da filosofia o método cético da Idade Moderna e deu-lhe uma aplicação convenientemente limitada, adequando-o às necessidades prático-empíricas da burguesia ascendente. Mas, assim como os pensadores de outrora invocavam o princípio da superioridade ontológica do imaterial sobre o material, sobretudo para justificar a existência de uma "alma do mundo", também nós poderemos dizer que a aplicação limitada (isto é, no campo material) de um princípio mais geral (quer dizer, fundamentalmente metafísico) nunca resultará num estado de coisas ontoepistemologicamente superior àquele que sucederia se este mesmo princípio fosse, naturalmente, entendido na generalidade que lhe é não só devida, mas originalmente própria.
- // -
Em estudos que se dedicam a versar sobre questões de epistemologia, convém começar por aquilo que é mais importante, seguindo a tradição iniciada pelos antigos filósofos jônicos, que se punham a discursar sobre a natureza no sentido mais amplo do termo. É necessário, no entanto, retificar um antigo erro, que é aquele mediante o qual o mundo exterior - ou o absoluto - é colocado em primeiro plano. Ao contrário, é o homem que é a origem de todas as intuições e demais operações mentais, e assim é ele quem deve ser considerado o objeto privilegiado de nosso inquérito. Se as coisas existem independentemente do homem, é certo que pelo menos ficam sujeitas às condições de cognoscibilidade mediante as quais adquirimos a consciência de sua existência, condições estas que são, por sua vez, determinadas pelas características perceptíveis do sujeito cognoscente. Algum de vocês poderia levantar a objeção de que isto é o mesmo que dizer que a percepção é condicionada pelas características da percepção, que, por sua vez, são o resultado da própria percepção - ou seja, que o que foi dito é um exemplo de lógica circular -, e, não obstante, o que acabam de ler - tanto uma como a outra coisa - permanece absolutamente válido. Como um princípio, é sem qualquer sombra de dúvida que podemos afirmar que o conhecimento é condicionado pelas condições da cognoscibilidade, simplesmente porque, sempre que se fala de conhecimento, fala-se também de um sujeito que conhece. O ponto em questão consiste justamente em saber, no âmbito particular, até quando e de que maneira estas condições afetam o que é conhecido, e, no geral, qual a relação existente entre o sujeito cognoscente e o objeto do conhecimento entendido de forma independente, isto é, qual a relação existente entre o sujeito e o númeno.
Na prática, esta dinâmica se faz evidente mesmo durante o nascimento. Quando se dá a luz a um bebê, uma coisa digna de nota acontece: ele chora. Dizem os entendidos que a penetração do ar pelas narinas, preenchendo as vias aéreas e os pulmões, provoca uma sensação de queima, mas o fato é que ninguém se recorda das sensações que experimentou quando era ainda um recém-nascido. Outro fato diz respeito à interpretação deste fenômeno: é evidente que, logo após e mesmo durante o nascimento, a presença do mundo exterior é sentida pela primeira vez sob a forma de dor, como uma agressão. O mundo exterior, alheio ao "eu", se insinua sobre o indivíduo com todos os característicos da violência, uma violação tão poderosa que a criança não pode nem olhar para os outros homens e mulheres que tão ansiosamente a aguardam do outro lado do ventre, já que fecha os olhos e se encerra em si mesma. A dor e a violência, no entanto, cumprem aqui um papel educativo fundamental, porque é através delas que a criança se torna capaz de evoluir nos estágios do seu percurso de desenvolvimento natural, rumo à maturidade. Este fato confere à condição humana um sentido teleológico: o homem é trazido para este mundo para sofrer. Escapar ao sofrimento é virtualmente impossível. Mais: ele nasce já preso às correntes do querer, seu primeiro ato nesta Terra é um ato de querer, que é o desejo da cessação da dor. As implicações deste fato são profundas porque, como vocês devem saber, uma criatura que fundamentalmente só se preocupa em escapar à dor e fomentar o prazer não pode ser considerada um provedor de testemunhos particularmente confiável, nem em matérias do direito, nem no campo da ontologia.
De mais a mais, por mais que para um recém-nascido o sentido da existência, o significado mesmo da realidade se esgote na dor causada pelo contato violento com o mundo, é evidente que nem um único indivíduo de nossa espécie terá, passados os momentos iniciais da infância, a mesma opinião que outrora teve a respeito das sensações que constituem o universo entendido como um fenômeno, coisa que vocês devem considerar, porque serve de motivo para o nosso ceticismo. Se em nossas vidas já houve um momento em que possuíamos uma visão tão limitada do mundo, o que nos garante que, se comparada com o universo tal como ele realmente é - isto é, com o universo enquanto númeno -, a nossa compreensão da realidade não seja igualmente limitada, por analogia tão ou ainda mais ingênua e infantil? Este é um ponto importante sobretudo porque razões para duvidar dos sentidos há muitas, mas vejam: para um recém-nascido, não são só os sentidos que atuam para corroborar a tese de que o significado do mundo se esgota na dor. Se, mesmo desde a mais tenra idade, há na criança um princípio de razão - e tudo indica que há, sim, este princípio -, também esta razão deve atuar de modo que a dor seja elevada à categoria de elemento explicativo máximo da realidade, e, com efeito, se recém-nascidos fossem capazes de filosofar, elaborariam filosofias nesse sentido. Ultimamente, até mesmo a credibilidade da razão pode ser posta em dúvida com base, por exemplo, na sua incapacidade aparente de transcender a si mesma, de compreender o logos das coisas enquanto logos que existe verdadeiramente nas coisas, e não simplesmente enquanto logos do homem que é projetado sobre as coisas.
Mas a propriedade significativa da razão não é a sua pretensa capacidade de discriminar elementos ou qualidades verdadeiras acerca do real. Sua derradeira propriedade não é ontológica, mas epistemológica: ela nos compele a aceitar uma determinada coisa simplesmente porque, quando tudo o mais é considerado, não há outras alternativas. Assim, a razão é, no mínimo, uma força imperiosa que encontramos em nosso seio que, como a própria experiência pessoal há de confirmar, revela-se o melhor guia de que dispomos para avançar pelas veredas tortuosas da realidade, uma modesta luz de vela a iluminar um mundo naturalmente obscuro. Verdade é que não se equipara ao brilho de uma lanterna, mas entre cegos e ceguetas, que já há muito se põem a vagar por este mundo mal iluminado, em que só esporadicamente se vê um raio de sol, até mesmo a luz de um vaga-lume sucederá em esclarecer muitas coisas.
- // -
Voltando agora para o problema da ciência, cumpre aqui frisar as limitações da investigação empírica. O método científico depende da disponibilidade constante de evidências e, assim, faz-se inútil quando elas eventualmente se tornam indisponíveis. Além disso, como o conhecimento científico tem por ponto de partida sempre a empiria, toda ciência tem por objeto a matéria e os seus efeitos, já que só a matéria e os seus efeitos são empiricamente observáveis, e, portanto, ocorre que é impossível conceber cientificamente um universo em que a matéria não seja o princípio explicativo fundamental da realidade, isto é, não é possível elaborar uma conceitualização científica do cosmos fora do materialismo. Isto se dá por uma decorrência do próprio método empírico-científico, já que, admitindo somente o observável como ponto de partida e fundamento primeiro da realidade, a ciência fica impossibilitada de explorar as hipóteses idealistas acerca da constituição do universo, porquanto estas hipóteses se baseiam na premissa de que o fundamento primeiro, o ponto de partida da realidade mesma, é o imaterial, isto é, justamente aquilo que é imanente e não-observável nas coisas.
Ora, uma vez que aceitamos o que foi dito anteriormente, vejamos aonde isto há de nos levar. Em primeiro lugar, consideramos que não existe ciência fora do que é observável, mas o que é observável não só está sempre em movimento - o que é evidente por si só -, é observável justamente porque se insere no domínio daquilo que se move, visto que o próprio ato de observação é movimento. Assim, sem o movimento, a própria observação é impossível, do que decorre que não haveria nem empiria e, por conseguinte, nem ciência, se não houvesse o movimento. Portanto, é necessário que a compreensão materialista da ciência acerca do cosmos tenha o movimento e, consequentemente, o tempo como pontos de partida. Entretanto, como vimos, toda ciência tem por objeto a matéria e os seus efeitos, do que sucede que, se a compreensão materialista da ciência tem o movimento e, por conseguinte, o tempo como pontos de partida, também deverá ter a matéria e, consequentemente, o espaço como pontos de partida, porque aquilo que se move só se pode mover enquanto é uma decorrência da matéria que se move ou a própria matéria que se move. Alternativamente, se a compreensão materialista da ciência tem por ponto de partida a matéria, que entendemos como tendo a qualidade inerente de ser observável, tem como ponto de partida também o tempo, porque toda observação se dá num âmbito temporal. Desta forma, o conhecimento científico fica preso tanto à matéria como ao tempo, isto é, limita-se a um âmbito temporal-material-espacial.
Estas são as restrições impostas pelo método empírico-científico: transcendê-las é impossível sem a modificação do paradigma epistemológico subjacente. Conferindo-lhes a forma de premissas e conclusões, temos o que se segue:
§1. Tudo é matéria e movimento. Matéria e movimento são indissociáveis. O primeiro o é em relação ao segundo porque, por um lado, o próprio ato de experiência da realidade material, porquanto implica numa ação, é movimento, e, por outro, se se concebe a matéria sem experiência, ela já não é matéria. O segundo o é em relação ao primeiro porque não há movimento sem o que é movido, e se o que é movido não é matéria, pressupõe de alguma forma a matéria.
§2. Se se acredita que o movimento não existe, deve-se demonstrar a sua inexistência, e qualquer demonstração desse gênero deverá pressupor, necessariamente, o movimento, do que sucede que tal demonstração é impossível. Se, diversamente, acredita-se que o movimento é uma ilusão, então se deverá indicar a fonte de tal ilusão, e como a própria causalidade é movimento, não se poderá estabelecer uma causa sem que assim se pressuponha o movimento, do que sucede que também esta demonstração é impossível.
§3. O mesmo é válido se se acredita que o movimento teve início fora do próprio movimento, porque se teve início fora do próprio movimento, então foi causado por alguma outra coisa sem que assim se pressuponha o movimento, o que é um absurdo.
§4. Como o movimento nem inexiste, nem é ilusório e nem se origina fora do próprio movimento, conclui-se que ele é eterno.
§5. Se o movimento é eterno, manifestando-se sempre através de algo que é movido, então algo capaz de ser movido deve existir eternamente.
§6. Se, como vimos, o que é movido e não é matéria pressupõe, no entanto, a matéria, e se, como vimos, algo capaz de ser movido deve existir eternamente, então também a matéria deve existir eternamente.
§7. Movimento e matéria existem eternamente.
Vejam que não afirmamos que o movimento e a matéria são positivamente eternos, apenas que sua eternidade é uma conclusão natural das premissas empíricas do método científico, isto é, das suas pressuposições mais elementares, não podendo, portanto, ser refutada com base em pressupostos epistemológicos de ordem empírico-científica. Toda afirmação do contrário só é possível se se ignora a contradição que inevitavelmente resulta da negação da matéria e do movimento com base em tais pressuposições. Mas, com efeito, se aqui há o ensejo de fazer uma pequena observação, e se considerarmos que o movimento alguma vez não existiu, então, naturalmente, ele teria de ser criado fora do próprio movimento, o que é, evidentemente, um absurdo, e, de igual modo, se a matéria já não existiu, então também ela teria de ser criada a partir daquilo que não é matéria, e esta é - poder-se-ia dizer - uma possibilidade anticientífica, já que diz respeito ao âmbito epistemológico próprio da filosofia, não da ciência. Para concluir, permitam-me voltar ao início e dizer que também isto serve como uma demonstração da utilidade e atualidade da filosofia, que nunca se tornará obsoleta, salvo se morrer o último homem que se põe a vagar por esta Terra, ou se se apagar a derradeira luz que o alumia e que o mundo clareia. (Ivan Preuss)
Nenhum comentário:
Postar um comentário